Foto: Isabelle Rieger/Sul21

Diário da Enchente

Inspirado no Diário da Pandemia – uma pessoa por dia, um dia de cada vez, iniciativa de Julia Dantas – o Diário da Enchente reúne relatos sobre a maior tragédia climática do Rio Grande do Sul. Editado por Luís Felipe dos Santos (@lfds85) e Raphaela Flores (@rapha_donaflor). Foto: Isabelle Rieger.

Carta para minha avó, por Roberta Pinto

*Texto enviado no dia 19 de maio de 2024.

Interessante onde buscamos forças em momentos de crise, como a que vivemos hoje no meu estado, o RS.

Tenho pensado muito na minha avó paterna. A vó Leboutte (sobrenome de origem francesa que ela carregava com orgulho) era uma mulher curiosa e inquieta. Sol em Gêmeos com Mercúrio em Câncer, tinha excelente memória. Gostava de ler, conversar, assistir novelas e fazia doces maravilhosos. Estava sempre bonita e arrumada. Herdei dela o gosto pelo batom vermelho, uma das suas marcas registradas.
Espectadora da primeira fila dos monólogos que eu inventava quando queria ser atriz, também me deu de presente o meu primeiro uniforme completo da Mulher Maravilha. Sempre tinha na cozinha potes cheios com os biscoitos amanteigados que eu adorava. Nas nossas inúmeras conversas sempre dizia para eu nunca parar de estudar, pois “o conhecimento é a tua maior riqueza, Roberta“.
Entre as histórias que minha avó contava do passado estavam as de duas enchentes: a de 1941, em Porto Alegre, e a de 1965, em São Leopoldo. Mostrava fotos e relatava suas lembranças de tempos difíceis.
Claro, quando a vó passou pelas duas enchentes não tinha fake news e nem essa onda negacionista que existe hoje. É exaustivo viver na era do extremismo, vó.
Passados 15 dias do início do período mais longo das nossas vidas, o meu coração segue inquieto mas pulsa bem, pois as pessoas e animais que amo estão seguras, assim como eu.
Porém esse sentimento não me traz conforto o suficiente. Existe muita gente que precisa de ajuda, e vai continuar precisando por um bom tempo. É necessário seguir bem e também fazer algo por quem não está. São duas frentes que andam juntas.
Consciência se faz com CIÊNCIA. E para superar essa crise é preciso investir na nossa maior riqueza: o conhecimento.
Fecho os olhos e consigo escutar a voz da minha vó Leboutte me dizendo essas sábias palavras enquanto abre o pote que exala o delicioso cheiro dos biscoitos amanteigados.
A lembrança da sabedoria da minha avó tem sido o meu refúgio nestes momentos desafiadores.

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